Artigo

Momento ônix

Paulo Rosa - Caps Porto, Ambulatório Saúde Mental, Telemedicina PM Pelotas, Hospital Espírita - [email protected]

Precisão cirúrgica e ironia machadiana. Um de nossos sagazes jornalistas políticos aqui do Diário, José Ricardo Castro, detectou em nossa Câmara Municipal o que ele designou como "momento ônix". Em um embate entre edis adversários, há poucos dias, um deles inquiria qual a pauta da visita da chefe do Executivo, que se anunciara. O demandante, não conseguindo obter o teor da referida pauta, repetiu várias vezes a mesma pergunta, obtendo sempre o mesmo resultado: que a prefeita estaria presente.

Uma réplica, um "momento ônix", em alusão ao ainda recente confronto televisivo entre o governador gaúcho eleito e o sr. Onyx Lorenzoni (sem acento), no qual procurava aquele extrair deste, sem sucesso, alguma alusão onde se vislumbrassem as pretensões executivas do acima nomeado senhor. Depois de quase uma dezena de insistências e respostas repetitivas, iguais, e vazias, adveio cavalheiresco silêncio. Aos gaúchos resultou-nos a visão do patético: como pode alguém postular-se candidato a cargo público _ estadual, federal, municipal, qualquer um _ sem uma consistência mínima, uma coerência, ainda que discreta, entre pensamento, palavra e ação? Pensarão, tais senhoras e senhores, que o povo é trouxa? Que basta dizer qualquer coisa, qualquer asneira, que gozarão sempre de crédito? Como não recordar da expressão de perplexidade e tristeza do cortante Décio Pignatari sobre nosso país, nos anos 80: Podbre Brasil, crônicas políticas publicadas na Folha, editadas em livro por Pontes Ed., Campinas, 1988. Quarenta anos depois, desgraçadamente, teremos de repetir o escritor?

Sempre que me sinto abalado pela destruição humana, consulto o filósofo e imperador (rara mistura) romano Marco Aurélio, que governou Roma do ano 161 a 180, quando de sua morte. Testemunho de crises de fome e pragas do Império, dedicou-se aos estudos da filosofia estoica e, quando na região do rio Danúbio, escreveu suas Meditações, exemplos de humanidade e humildade. Ele abre o Livro II, advertindo-nos: "previne-te a ti mesmo a cada amanhecer: hoje encontrarei um intrometido, um mal-agradecido, um insolente, um astucioso, um invejoso, um avaro". Um pouco adiante: "em todos os teus atos, ditos e pensamentos procede como se houvesses de deixar a vida dentro de pouco". Na Meditação 17, Os pensadores, volume 5, pág. 279: "da vida humana, a duração é um ponto; a substância, fluida; a sensação, apagada; a composição de todo o corpo, putrescível; a alma, inquieta; a sorte, imprevisível; a fama, incerta. Em suma, tudo que é do corpo é um rio; o que é da alma, sonho e névoa; a vida, uma guerra, um desterro; a fama póstuma, olvido. O que, pois, pode servir-nos de guia? Só e única, a Filosofia".

Resta seguirmos atentos às fragilidades próprias e alheias, por inevitáveis.

Finalizando, dentre as pedras semipreciosas prefiro o feldspato, o quartzo ou a turmalina ao ônix. Melhores e bem mais firmes cores.

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